Malandrices

Os prédios de apartamentos da Av. D. João III em construção

Por vezes, em conversas com os meus amigos de infância, abordamos as “malandrices” e os lugares das nossas brincadeiras, e quase sempre fico com a ideia que o tempo teima em acabar por apagar quase tudo. Isto porque seria normal ver as gerações posteriores á minha ter as mesmas atitudes, como foi normal a minha ter copiado das gerações anteriores, exemplo era as brincadeiras do tempo do meu pai que nós os que hoje estamos na casa dos 40 (quase 50) copiamos.
Embora de uma geração anterior á revolução de Abril de 74 e que penso responsável, tenho a consciência de ter participado em algumas partidas aos vizinhos que de nada me possa orgulhar hoje em dia.
Já muito tenho escrito sobre a minha infância e juventude e sobre como tenho pena de não ter tido as tecnologias que a garotada tem hoje em dia, no entanto acho que a minha geração foi sem duvida mais feliz e naturalmente mais saudável, brincando ao ar livre sem as preocupações das actuais.
Recorde-me de muitas das partidas que pregávamos aos vizinhos, principalmente os que moravam nos prédios que na altura tinham acabado de serem construídos na Avenida D. João III.
E não julguem que era simples partidas de bater á porta e fugir, não, era uma coisa mais bem elaborada, como por exemplo amarrar com uma corda bem grossa uma porta á outra, após estarem bem atadas batíamos ás duas campainhas em simultâneo, as portas abriam-se e como é evidente cada vizinho puxava a porta para o seu lado, o mais engraçado era quando um deles mais esperto tentava pôr a mão no lado de fora da porta e o vizinho em frente largava a sua e trancava-lhe os dedos.
Outra partida bem maldosa era pegar numa folha de jornal ir a uns pastos que existia onde hoje é o “Hotel Lince” embrulhar a maior bosta de vaca que encontrávamos no jornal depois colocávamos na porta de um vizinho nos prédios, largávamos fogo ao jornal e batíamos á porta era esperar para ver o resultado, a aflição bem como a reacção era sempre a mesma, tentar apagar o fogo com os pés, estão a ver o resultado final.
Do grupo de amigos da minha adolescência havia, um que infelizmente já faleceu, que tinha um descaramento que mais nenhum de nós o tínhamos, uma das partidas preferidas dele era pôr-se no canto em cima da rua do Poço com uma mala de viagem a fazer um pranto, a chorar “baba e ranho”, quando alguém ao passar lhe perguntava o que se passava a resposta era sempre a mesma, “a minha mãe mandou-me para o seminário e estou perdido”, as pessoas aprontavam-se a ajudar a levar o pobre rapaz ao local, este desatava ás gargalhadas irritando quem tinha sido enganado.
Agora os anos passaram e vejo os sobrinhos e filhos dos meus amigos a não terem possibilidade de fazerem estas traquinices. Um dia vou contar-lhes que existiram tempos e vizinhos, que nos davam a inspiração para muitas e belas partidas.

João Freitas